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quarta-feira, 11 de abril de 2012

NUNCA PARE DE REMAR

Um dos encantos da vida é aprender a observar que nada está parado. Tudo flui, segue, gira, cresce, muda, modifica-se. O estático é uma ilusão da mente. As células envelhecem. Os elétrons vagueiam ao redor do núcleo do átomo. E o tempo, que intuitivamente não para, na verdade sequer existe, de acordo com a concepção socrática.
Se estas afirmações parecem ser verdadeiras, não faz qualquer sentido buscar a estagnação. A ausência de impulso e de transformação do ser humano não se harmonizam com o fluxo da vida. E o querer reter, prender, conservar e manter também se insere no campo das atitudes que desafiam o ritmo da existência.
Há pouco menos de um ano, tive uma séria lesão na coluna que, ao menos até agora, impediu-se de voltar a montar. E você não imagina como eu sinto falta dos meus amigos equinos, do cheiro do campo, das cores das flores, da garoa no rio, dos cabelos ao vento. Não sei se um dia volto. Mas se eu puder voltar, estarei retornando a raízes profundas e correrei por vales, montanhas, estradas e regatos até entender o mito da criação e alguns dos mistérios da vida.
Mas não pense que estou parada. Uma impossibilidade momentânea não precisa significar a sua paralisação. Você tem que procurar outra coisa para aprender, estudar outras maneiras de fazer e desenvolver outras partes do seu corpo e da sua mente.
E foi assim que livrei minha alma do aprisionamento neste último ano. Escolhi outros caminhos e outros desafios. Vou contar como foi.
Primeiro, mudei de habitat. Troquei a terra quente e seca pela água fresca e apurei meu gosto pelo mundo subaquático. Vi peixes, crustáceos, corais e muitas outras formas de vida que eu jamais imaginei que pudessem existir. Depois, desci a um universo antes impenetrável. Aprendi a mergulhar e compreendi que até mesmo para os nossos pulmões existe uma alternativa. Nadei com golfinhos, baleias e tubarões e, nas profundezas de oceanos cristalinos, encontrei cores e movimentos inusitados. Dancei ao redor de embarcações submersas e percorri labirintos e túneis com vagar e precisão.
Num terceiro momento, voltei à superfície. Viajei em  motores, velas e remos e senti outras temperaturas e sensações esbarrando em minha face. A velocidade é inebriante e tudo aquilo que te transporta é realmente capaz de te levar muito além. Mas desta vez eu não conduzi. Deixei-me ser guiada e em tais momentos de rara contemplação apenas me entreguei.
E então era hora de voltar ao comando. Fazia tempo que eu não segurava nas rédeas, mas não me esqueci de como era me levar a mim mesma. E aprendi a manejar o remo em cima de uma prancha. Minha primeira lição foi nas águas rebeldes do Oceano Pacífico. E depois de muitas e muitas quedas, finalmente comecei a equilibrar-me. E logo descobri uma sequência lógica em tudo isso.
O passo inicial é carregar a prancha até o mar. Se você não conseguir carregar, arraste. Se você não conseguir arrastar, peça ajuda. Mas não desista. Em seguida, deite-se sobre ela e flutue em direção ao horizonte. Quando se sentir preparada e como quem faz uma prece, ajoelhe centralizadamente e comece a remar. Nesta hora você começa a subir. O remo é longo e único e o trajeto da sua prancha é controlado por meio da alternância, ao lado esquerdo e direito. Passando a arrebentação, fique em pé e continue remando, pois, se você parar por um segundo, é certeza que vai cair. Se vier uma onda mais forte, tente concentrar-se. E se não der certo, não tem problema nenhum. Sua prancha estará atada a seu pé. É só subir  de novo e recomeçar. Quantas vezes sejam necessárias.
Aprendi muitas coisas com estas novas atividades, que não são nada diferentes da nossa forma de viver a vida. Para mergulhar, o importante é ter calma e respirar para poder observar a beleza do desconhecido. Para ficar em pé numa prancha, é só concentrar-se e equilibrar-se para poder seguir em frente. E para seguir num barquinho tripulado, é só deixar-se conduzir.
Não sou atleta, mas sou muito bem intencionada e dedicada às minhas metas. E afirmo que dá para aprender uma coisa ou outra, ou todas. Mas se você não quiser, tudo bem. Eu já disse o que eu achava essencial. Nos momentos de dificuldade, apenas lembre-se destas singelas lições teóricas. E sempre aja como se você já soubesse fazer. Respire fundo, concentre-se, observe, equilibre-se, eleve-se e, o mais importante de tudo, nunca, mas nunca mesmo, pare de remar.

(Baleias - foto extraída de http://www.marinewatchnsw.com/)